09/07/2020 - Curva em ascensão, retomada agora não!

     O SINPEEM tem reivindicado, desde antes do início da quarentena, proteção à vida e aos direitos dos profissionais da educação, sempre firme em defesa do ensino presencial para garantir o aprendizado dos alunos. Mesmo diante da crise pandêmica conseguimos frear tentativas reiteradas de diminuição de salários, resguardar os profissionais que se enquadravam no grupo de risco e insistimos que as escolas devem permanecer fechadas. A Secretaria Municipal de Educação (SME), após a audiência pública na Câmara sobre os protocolos de retorno às aulas publicados pelo governo do Estado, divulgou uma minuta para a categoria discutir um possível retorno no início de setembro, conforme proposta estadual, e as ações necessárias para essa retomada. Entendemos que o retorno este ano é precipitado e perigoso para a saúde de toda a população paulistana.

     Para o SINPEEM, o segundo semestre de 2020 deve ser utilizado pelo governo para dialogar com as entidades sindicais, com os profissionais de educação e a comunidade sobre as reais necessidades da rede municipal de ensino e o que é essencial para garantir segurança sanitária e para que todos possam se adaptar a uma nova “normalidade” que será criada no pós-pandemia da Covid-19. Apresentamos aqui algumas considerações que devem servir como subsídio para a categoria dialogar com a comunidade escolar e participar das reuniões virtuais denominadas “Fala Rede”, debatendo com SME sobre retorno seguro pós pandêmico.


CONSIDERAÇÕES SOBRE A MINUTA DE PROTOCOLOS DA SME 

     Nossa maior crítica aos apontamentos da SME é considerar que seria possível voltar ao atendimento presencial nas UEs ainda esse ano. Mas o documento também peca em proposições importantes e é contraditório em diversos pontos, sendo, entretanto, positivo que tenha sido pautado para debate com os sindicatos e a categoria.


PARTE 1 - ORGANIZAÇÃO DO CALENDÁRIO E RETORNO

     1 - FORMAÇÃO e SAÚDE - Precisamos saber o tempo que essa formação tomará. Sugerimos que seja durante esse ano, em conjunto com a devida reorganização curricular indispensável à retomada no ano que vem, adequação do PPP e todas as ações necessárias à recuperação da aprendizagem prejudicada pela ausência de aulas presenciais durante esse ano de 2020. A formação pode ser feita em reuniões virtuais, aproveitando o PEA que este ano deve ser remodelado no fulcro legal para que possa ser devidamente pontuado. 

     Equipes de Apoio: deverão ser aumentadas em número para limpeza e alimentação, contratos emergenciais podem ser usados mas temos que retomar concursos para agentes escolares com urgência e homologação imediata do concurso de ATEs, com chamada ainda em 2020. 

     Para familiares e cuidadores: a minuta sugere que se meça a temperatura dos filhos... devemos lembrar que termômetros não são item de consumo essencial, atendemos a comunidades que não têm condições de comprar tais itens, comunidades com alta taxa de desemprego, famílias em vulnerabilidade social. Devemos pensar em proteger essas crianças dando renda mínima cidadã para pais, mães, avós responsáveis legais ou de fato, até para manter essas mães trabalhadoras cuidando de seus filhos pequenos em casa, durante a pandemia e enquanto a escola estiver sem condições de ter atendimento presencial.
 
     Para os estudantes: “(...) repetir informações (...) garante que as práticas de distanciamento e higiene pessoal (...) transformem-se em ritual”. Destacamos esse trecho do texto da minuta. Não nos parece uma forma de aprendizado dialógico, crítico, libertador, algo muito difícil de se alcançar com crianças pequenas, crianças maiores ou jovens. Aliás o documento, não parece ser direcionado à Educação Infantil. Quanto às crianças com deficiência, CEFAI e PAEE não têm dado apoio nas condições normais de temperatura e pressão, e então passarão, milagrosamente, a ter condições objetivas de fazê-lo durante a pandemia? Acreditamos que não e SME deve proporcionar condições objetivas de atendimento a elas.

     2 - CANAIS DE COMUNICAÇÃO -
 Favorecer a comunicação remota sem que o governo municipal se comprometa a prover as comunidades escolares de equipamento e Wi-Fi gratuito será uma medida inócua, não alcançará êxito. Somente 40% das famílias têm smartphones e os custos da internet inviabilizam esse canal próprio a esses tempos de distanciamento social.

     3 - ORGANIZAÇÃO DOS AMBIENTES Não há detalhamento quanto ao módulo necessário de QA para coordenar essas ações. Como, por exemplo, “ventilar regularmente as instalações?”. Abrir janelas que não existem? Os gestores das escolas reclamam que pedem reformas estruturais há anos mas quando elas acontecem não se leva em conta as especificações apresentadas pelos profissionais da Educação, os “engenheiros fazem o que querem”. Escolas possuem janelas chumbadas e hermeticamente fechadas para impedir vandalismo, roubos, etc. Salas arejadas constantemente serão imprescindíveis. Esse ano deve ser usado para reformar todas as escolas e garantir essa ventilação majorada e saudável. Ventilação mecânica NÃO É INDICADA pois faz os vírus circularem num ambiente fechado e sem janelas amplas. Todas as sugestões de organização e limpeza de refeitórios, banheiros, etc., exigem aumento de módulos do QA principalmente, e da limpeza há muito terceirizada e recentemente diminuída em 70%, antes mesmo da quarentena.

     4 - PLANO DE FLUXO INSTITUCIONAL - Mesmos problemas de falta de pessoal para tantas funções de inspeção, fiscalização e cuidados organizacionais. Em que espaços isolar crianças febris, algo que sempre ocorre nas escolas? Como impedir entrada de pais e responsáveis sem uma discussão criteriosa e coletiva para construir essa normatização? Ainda mais complexa no caso de bebês e crianças pequenas que ainda não desenvolveram autonomia necessária. Não compartilhar objetos pessoais, brinquedos? Sabemos que apenas internalizamos conhecimentos construídos dialogicamente e as interações estarão prejudicadas sensivelmente sem o contato pessoal, sem trocas concretas. Bebês e crianças pequenas não conseguem seguir tais comandas, tampouco. Eles interagem, brincam, no chão. O fluxo único exigirá portões separados para entrada e saída de alunos. Certamente nenhuma aula poderá ter salas com mais de 15 alunos enquanto não houver vacina eficiente imunizando a população. Temos prédios escolares ociosos para usar? Um PEI precisará de quantos EPIs com diversas trocas ao dia para cuidar de bebês e crianças pequenas? Considerando ainda o rigor com a sanitização nos berçários, não será indispensável o uso de sapatilhas descartáveis? O documento de SME não resvala nessas questões, esperamos que seja no sentido de não permitir o retorno da Educação Infantil antes do controle total da pandemia dando condições financeiras às famílias para que um membro dentre os responsáveis possa ficar em casa ganhando renda básica suficiente para cuidar da criança.

     5 - PRÁTICAS DE SEGURANÇA - Além do que já foi apontado aqui, surpreende que essa minuta aponte para um distanciamento físico de apenas um metro de distância. Estudos garantem que essa medida proporciona 13% de chance de transmissão do coronavírus. Entre crianças e adolescentes o perigo é maior dadas as características de expansividade corporal própria da idade. Na Educação Infantil a contaminação tende a ser exponencial mesmo diminuindo a 1/3 a quantidade de alunos. Alunos que passarão a Covid para seus avós. O governo deve ter sensibilidade social, neste momento de pandemia, para evitar tragédias. Nossa prática no cotidiano escolar durante a pandemia é de termos tido informação a respeito de muitos gestores, agentes escolares e ATEs acometidos pela Covid-19 enquanto trabalhando presencialmente nas escolas pois apesar de exigirmos fechamento total das unidades, SME insistiu em não atender a nossas reivindicações. Os gestores comunicavam as UBSs imediatamente e... a resposta sempre foi nula, esses postos de atendimento não forneciam ajuda, não deram orientações, não submeteram os colegas e familiares da pessoa diagnosticada a testagem, não houve dispensa ou isolamento dos profissionais que tiveram contato com o infectado, a desinfecção do local não foi providenciada. O SUS, as UBSs, os hospitais públicos, em especial o HSPM, precisam de investimento e pessoal especializado urgentemente! No momento em que escolas reabrirem, o surto sofrerá um salto quantitativo e a saúde pública paulistana não tem condições de atender a população com presteza, capacidade de tratamento e cura, dignidade. A testagem de alunos e profissionais da educação anterior ao retorno de aulas presenciais é indispensável.

     6 - PROTOCOLO DE HIGIENE E DESINFECÇÃO Esperamos que seja testado em condições análogas às de aulas presenciais para que a retomada aconteça apenas quando tivermos condições de obedecer a esses protocolos de limpeza, com material e pessoal suficientes para a frequência mínima aqui estabelecida, com destaque para a higienização dos materiais e espaços nos CEIs e EMEIs, além de descarte dos resíduos. Pela periodicidade proposta precisaremos de inúmeras equipes de limpeza se revezando. Os contratos com empresas terceirizadas devem ser revisados e redimensionados para essa nova realidade que exigirá incremento dos processos de sanitização e limpeza, sempre lembrando que o SINPEEM defende a retomada dos concursos para agentes escolares.

     7 - PROTOCOLO DE TRANSPORTE Como monitorar o cumprimento de todas essas regras e orientações para os motoristas como propostas no protocolo? A escola não pode e não vai  assumir mais essa função. Evitar aglomeração no transporte dos alunos? A lotação, sendo limitada a 40%, por exemplo, como garantiremos que todas as crianças com direito ao transporte mantenham esse direito? E a remuneração destes transportadores? Há problemas desde há muito, como evitar desperdício de dinheiro público? O TEG deve ser remodelado e uma devassa nessas parcerias deve ser realizada para que o serviço oferecido seja de qualidade e sem ressalvas de ordem da lisura dos contratos.

     8 - PROTOCOLOS DE ALIMENTAÇÃO SME não  apontou como faremos para assegurar alimentação adequada para estudantes com comorbidades que não poderão frequentar a escola mesmo após controle inicial da Covid-19. O cartão alimentação deve ser aperfeiçoado e, quiçá, perpetuado.


PARTE 2 - ORGANIZAÇÃO PEDAGÓGICA

     É salutar que possamos ressignificar a formação dos profissionais da Educação municipal neste momento de dor,  sofrimento, luto, perdas. Que o PEA seja retomado sob a luz dessas reflexões ligadas ao emocional e psicológico, arte e literatura, transdiciplinaridade, enfim, a providência é  bem vinda. Sempre apontamos para diálogo com a categoria, que tem diversos profissionais trabalhando com arte, teatro, literatura e podem, certamente, socializar suas experiências com a rede, sempre em ambiente virtual nesse momento de alta contaminação da pandemia. Formações on-line com os familiares pressupõem políticas públicas de alfabetização digital e suprimento de equipamentos e internet acessível para a comunidade escolar.


PERÍODO DE RETORNO

     Entendemos que a garantia dos direitos de aprendizagem estão intimamente ligadas não apenas à necessidade de intervenção pedagógica própria ao que o ensino em ciclos propõe — a saber, a universalização do Ensino Fundamental por meio da democratização do acesso e permanência na escola pública, melhor possibilidade de organização do tempo e espaço escolares, do respeito aos ritmos e dos processos de aprendizagens dos alunos, da eliminação da cultura da repetência instalada na escola de outros tempos e da preservação da auto-estima dos alunos — como também é necessário reconhecer os alunos que precisam de assistência social e de saúde, individual e familiar, para poderem voltar a frequentar as aulas em segurança sanitária, psicológica e alimentar. Recuperar o aprendizado é desafio muito maior que o calendário burocrático institucional de 800 horas, é assegurar que todos os aspectos cruciais do currículo serão desenvolvidos nos anos restantes do ensino fundamental. Para tanto precisaremos de um módulo de professores aumentado com jornada de formação para todos, possibilitando docência Compartilhada e PEAs onde possamos ter alfabetizadores trocando experiências com seus pares do fund II para que qualquer defasagem em alfabetização, letramento e proficiência leitora, escritora, lógico matemática, etc. dos educandos possa ser retomada pelos professores nos ciclos intermediário e autoral, inclusive. Urge termos a JEIF como jornada do cargo docente!

     A proposta de SME de fazer dois anos em um, 2020-2021, não respeita a progressão continuada e seus princípios, temos a polivalência com ênfase na alfabetização do primeiro ao quinto ano e possibilidade de estender a alfabetização, que provavelmente é a fase mais prejudicada pela falta de interação presencial, até o nono ano do ciclo autoral usando das ações de apoio pedagógico necessárias ao desenvolvimento da aprendizagem daqueles que apresentem dificuldades persistentes. Avaliação diagnóstica das próprias escolas será necessária para o replanejamento do ensino, a reorganização do PPP, a adequação curricular e a recuperação continuada. Prova São Paulo, como tantas avaliações institucionais, são classificatórias e estabelecedoras de meritocracia ligada a prêmios entre os profissionais da Educação, instrumento que repudiamos, e não servem para avaliar as dificuldades dos estudantes. 

     No ensino fundamental as especificidades de cada UE deverão ser identificadas pela comunidade escolar e cabe ao coletivo da escola, usando o Grêmio, o  CE ou organização semelhantemente representativa, repensar a estruturação do tempo, espaço, PPP, currículo, etc., com o objetivo de retomar a caminhada não de onde pararam mas a partir do contexto social engendrado pela pandemia e toda a crise sanitária e político econômica que vivenciamos. Cada distrito e cada comunidade trará contribuições para o currículo da nova normalidade. 

     EDUCAÇÃO INFANTIL - A proposta apresentada de reacolhimento é plausível numa hipótese cabível apenas quando a crise pandêmica tiver sido controlada o que não é vislumbrado pela ciência neste ano de 2020, que deverá ser utilizado para as reformas estruturais imprescindíveis à retomada com a segurança sanitária proposta por esse protocolo quanto à higienização, fluxo de pessoas, fiscalização de estado físico e emocional dos bebês, crianças pequenas e crianças, alimentação em novas normas e formatos, limpeza e desinfecção, cuidados de distanciamento, etc.

     SME demonstra desconhecimento do cotidiano escolar nas suas propostas, desde o distanciamento que o texto sugere ser para todos menos para os bebês e crianças menores até a ausência de especificações quanto à necessidade de mais pessoal em todos os módulos escolares, limpeza em especial.

     Retomando o próprio texto de SME - “Como nos ensina Gaspar, começar sabendo que nossas ações podem, em algum momento, ser equivocadas, nos retira a obrigação de acertar em tudo e nos abre um campo humano seguro para fazer o melhor que podemos com o que somos, com o que temos, com o que podemos.” Esse trecho da minuta versa sobre ninguém ter a obrigação de acertar em tudo. Mas os governantes e a instituição escola pública municipal podem trilhar o caminho do acerto se democratizarem ao máximo as decisões, ouvindo as contribuições de quem está lidando com a comunidade diretamente: que os profissionais da Educação sejam ouvidos e suas reivindicações sejam acolhidas. Só assim teremos sucesso no retorno às atividades presenciais após a fase crítica da pandemia passar, em 2021.

A DIRETORIA
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